Historiador Rayllin Barros da Silva

A escola possui duas naturezas: a pública e a privada. Em todas as sociedades ao redor do mundo a primeira diferença consiste nessa divisão. Em recente debate, escrevi que a escola é a única capaz de promover a escolarização do indivíduo. Na reflexão, expus que a família é o espaço da educação (formação dos valores como moral e ética) e a escola, o espaço da escolarização (formação intelectual com base nos conteúdos e disciplinas).

Partindo dessa premissa e ao reconhecer a escola como espaço de formação intelectual do indivíduo, a reflexão objeto deste artigo é: Qual a principal diferença entre a escola pública e a privada? Primeiramente, é importante observar que o modelo de escola como lugar do conhecimento e como a conhecemos na atualidade tem suas raízes na Idade Média, sobretudo, a partir da atuação da Igreja Católica. O próprio conceito “escola” é criação da igreja, o mesmo é originário de “escolástica”, ou seja, conhecimento e ensino a partir de fundamentos cristãos e teológicos, que faria do indivíduo pertencente à escola, alguém sábio, instruído.

Portanto, a escola foi uma criação da igreja para formar o indivíduo do ponto de vista do conhecimento. Em que pese ainda hoje a igreja deter significativa atuação no campo escolar, é interessante observar que com o fim da Idade Média e o advento da modernidade, em linhas gerais, a escola foi se “desprendendo” da igreja e se laicizando. Dessa laicização surgiram duas dimensões da escola moderna: a pública e a privada.

Sobre a escola pública, é importante inferir que somente nos países de tradição católica e influência da colonização europeia que a escola pública é vista como uma dimensão diferente da privada. Em países europeus, da América do Norte e do continente asiático, praticamente não existem diferenças entre a escola pública e a privada, nem na formação dos indivíduos, nem na qualidade do ensino e ainda na estrutura das escolas. No caso brasileiro, a escola pública é aquela mantida e gerida pelo poder público, nos seus três níveis: federal, estadual e municipal.

Ela é mantida com recursos públicos, os impostos arrecadados dos contribuintes. Basicamente, o montante aplicado na escola pública varia de estado para estado, ou de município para município. Seus professores e demais quadros de funcionários são servidores públicos, concursados ou não. O indivíduo como se sabe, não paga diretamente pelo ensino recebido, muito embora pague na forma de impostos. Por sua vez, a escola privada é aquela que não pertence ao poder público, mas gerida e mantida pela iniciativa privada. Essas escolas, na sua maioria, cobram valores significativos para a administração desse tipo de escolarização.

Dependendo da tradição que cada escola privada possui, sua estrutura e índices de aprovação nos exames externos, essas escolas se transformam em verdadeiras empresas, gerando lucros significativos. Basicamente, essa é uma importante diferença entre a escola pública e a privada: quem a mantém. Mas seria essa a principal diferença entre essas duas dimensões escolares? Infere-se, com certa tranquilidade, que não. Mas por que as escolas da rede privada alcançam na maioria das vezes superioridade na qualidade da escolarização oferecida e maiores índices de aprovação nos exames externos em relação às escolas públicas?

Não é de negar que, ao deter melhores estruturas, esse tipo de escola pode, de fato, oferecer uma escolarização melhor ao indivíduo. Mas acredita-se, mesmo com essas visíveis diferenças, que o maior problema da escola pública – além da ausência de estrutura, professores não valorizados, ausência de tempo livre para estudos do professor e ingerência política nas escolas – é ainda um fator externo ao ambiente escolar: a família. Mas por que a família está, segundo nossa compreensão, na base da principal diferença entre a escola pública e a privada?

Porque, ao que parece, a família de um aluno da escola pública, por não pagar a escola de seus filhos, não cobram os resultados devidos de aprendizagem dos mesmos. Ao passo que as famílias de alunos da escola privada, pelo fato de desembolsarem valores significativos para manterem seus filhos na mesma, cobram resultados, acompanham melhor seus filhos. A escola para essas famílias é investimento, já a escola pública para a grande maioria das famílias dos alunos não é investimento, mas um passatempo.

A maior diferença, segundo nossa compreensão, não está na estrutura, no professor ou no conteúdo da escola privada em relação à escola pública, mas no acompanhamento da família e na forma como essas cobram resultados de seus filhos, como também, vale lembrar, no próprio grau de interesse dos alunos.

De forma que mesmo a escola pública com a melhor estrutura possível e professores qualificados, de nada adianta essas qualidades se os pais não acompanharem o aprendizado de seus filhos e os cobrarem por resultados, como também os alunos de igual forma não tiverem interesse o suficiente em aprender para, por intermédio da escolarização, alcançarem o conhecimento necessário para os desafios da vida: seja a faculdade ou o mercado de trabalho. A principal diferença, portanto, não está no fato da escola ser pública ou privada, mas nas famílias dos alunos e nos próprios alunos e o grau de compromisso que esses possuem com a instituição escola e o processo de escolarização por ela oferecido.

Sobre o autor

Raylinn Barros da Silva é Doutorando e Mestre em História pela Universidade Federal de Goiás.