A disputa judicial de cobrança de seguro, entre um motociclista residente em Palmas que se acidentou no município de Pugmil e sofreu invalidez permanente e uma companhia de seguros paulista gerou a produção de uma petição e uma decisão em forma de poesia em processo que tramita na 4ª Vara Cível de Palmas.

Após a seguradora ajuizar uma ação conhecida como exceção de competência, defendendo que a ação de cobrança ajuizada pelo motociclista não poderia tramitar na Comarca de Palmas e, sim, na de Paraíso, que abrange Pugmil, o advogado da vítima contestou a seguradora em versos.

Em uma única estrofe com 18 versos livres (e quatro referências a doutrinas e leis que embasavam sua petição), o advogado defendeu a opção legal do motociclista em cobrar o seguro em Palmas, cidade onde reside, e pediu ao juiz que rejeitasse a ação da seguradora.

Petição do advogado

"O autor sobre o evento sete (07) vem falar

Que lesado foi ao acidentar

Por isso, procurou onde a demanda ajuizar

Preferiu o domicílio do réu sem vacilar

Sendo competência territorial pôde optar

Seja, onde há sucursal ou onde morar

Isso é jurisprudencial não precisa reafirmar

Ademais, o réu sabe que deve pagar,

Aqui ou em outro lugar

Porém, para modificar, não basta alegar

Prejuízo tem que demonstrar

Sobre esse intento não conseguiu provar.

Portanto, o autor para finalizar

Pede para o doutor, a presente rejeitar

Essa é a contestação,

Parece de canastrão

Mas, sem atrevimento.

Pede, suplica o deferimento", compôs o autor da contestação, o advogado Carlos Antonio do Nascimento.

Membro da Comissão do Sistema Penitenciário da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Tocantins, ele explicou que a petição em verso se inspirou no lendário habeas corpus de Ronaldo Cunha Lima, poeta e ex-senador, enviado a um juiz em versos. Também revelou que a intenção foi valorizar a língua portuguesa e suas formas literárias, sem deixar de seguir as diretrizes do Código de Processo Civil brasileiro ou ofender a outra parte no processo.

Para a surpresa do advogado, o juiz Zacarias Leonardo mesclou prosa (adotada na parte do relatório da decisão) e poesia (na parte em que fundamenta sua decisão) para negar a procedência da ação da empresa.

Resposta do juiz

"Em versos e jurisprudências responde o excepto;

Não pode ser acolhida a exceção; acertado pontua;

O juízo competente é do domicílio do autor ou do local do fato;

Esqueceu-se a excipiente não ser escolha sua.

A lei contemplou o domicilio do autor ou o local do acidente;

Assim é mais fácil para a vítima do sinistro pensou o legislador;

Em sua casa, com sua gente ou onde se feriu o requerente;

Pareceu mais propício buscar lenitivo e reparo à sua dor;

Mas, onde mora o requerente? Perquire o judicante;

Mora em Palmas e se feriu quando no interior se encontrava;

Em seu parágrafo único o artigo cem (100) soluciona o embate;

O foro do domicílio do autor era escolha que bastava.

A contestação não parece de canastrão;

Pelo contrário, sem respaldo legal e sem assento;

Parece, isto sim, a exceção, uma medida de protelação;

Coisa de instituição financeira querendo ganhar tempo.

De fato a jurisprudência é de remanso;

Por outro lado a legislação é de meridiana clareza;

Enquanto o requerente espera ansioso o desfecho;

Navega tranqüila a seguradora sob o benefício da destreza,

É preciso colocar na espera um ponto final;

Por isso, sem mais delongas, porque não sou poeta;

Firmo de logo a competência do juízo da capital;

É aqui que se deve resolver o quanto o caso afeta", anotou o juiz nas cinco estrofes que usou para fundamentar a decisão pela improcedência da ação da seguradora.

Ao encerrar sua decisão, em duas páginas, o juiz reafirma o posicionamento em prosa. "Face ao exposto, nos moldes do artigo 100, parágrafo único do Código de Processo Civil, rejeito a exceção reafirmando a competência do Juízo da Comarca de Palmas para conhecimento e julgamento da questão".

O motociclista ingressou com a ação de cobrança de seguro obrigatório, contra a Itaú Seguros, para receber a indenização, a título seguro DPVAT, no valor de R$13.500,00, após invalidez permanente decorrente de acidente de trânsito ocorrido em novembro de 2010.  A decisão, do início do mês de junho, faz com que a ação de cobrança original, ajuizada em junho de 2013, tenha prosseguimento normal em Palmas.