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O que é e de onde vem o novo coronavírus ou a covid-19?

Uma reflexão histórico-filosófica sobre o novo coronavírus

Uma força invisível parece avisar que algo está errado.

Questão complexa e difícil esta: saber o que é e de onde vem o novo coronavírus ou a covid-19. Talvez demore muito tempo para obtermos uma resposta adequada ou talvez não a tenhamos nunca. De todo modo, o fato é que, novamente, uma força invisível parece avisar que algo está errado.

Instalando-se como evidência na mente do povo e no laboratório da ciência, ela aparece transparecendo-se um problema que a natureza coloca nas mãos de toda a humanidade. E a mensagem parece evidente: respeito, bom senso, prudência e obediência ao que é certo: particularmente no que diz respeito ao comportamento dos homens na natureza e com outras formas da existência geral.

Origem de laboratório?

A primeira “tese” sobre a origem do novo coronavírua é a do laboratório, esta considerada de natureza “conspiratória”, pelo menos na moda ou no jargão cultural atual. Sua gênese está localizada tanto no Ocidente como no Oriente, este ainda não totalmente ocidentalizado.

Elaborada na zona ou na esfera das duas “capitais” mundiais, a “tese” laboratorial tem como pano de fundo a disputa pela hegemonia comercial em um mundo plenamente globalizado. De acordo com essa primeira ideia, o novo coronavírus foi produzido em laboratório da China ou dos Estados Unidos da América como esforço empreendido na guerra comercial entre ambos, visando assim a vitória comercial de uma sobre a outra. 

Aviso de Deus?

A segunda “tese”, surgida quase que simultaneamente com a “tese” do laboratório, é a religiosa, elaborada pelos cristãos. Esta se subdivide em três variantes: duas que podem ser denominada de sobrenatural ou sagrada e demoníaca; e uma outra que pode ser denominada de “tese” bíblica, apocalíptica ou do fim dos tempos.

Na “tese” sobrenatural, elaborada por religiosos fundamentalistas, o novo coronavírus seria Deus avisando os homens que eles estão perdidos ou subsumidos pela sede de perversão, pela crueldade de uns para com os outros, pela falta de amor, de compaixão, de fé e tudo mais.

 Neste caso, o novo coronavírus seria uma medida de Deus com vistas a fazê-los refletir, a voltar ao âmbito da espiritualidade profunda perdida com o apego aos interesses da cultura material baseada no comércio fortuito e nas finanças sem controle.

Para esses, o fechamento de igrejas e templos, como primeira medida adotada por autoridades religiosas e políticas, seria a mais pura evidência do descontentamento divino com o desvirtuamento das instituições religiosas, por seguirem práticas e valores anticristãos; para outros, não menos fundamentalistas, a covid-19 seria a oportunidade demônio diante da fraqueza moral das pessoas, diante da ausência de Deus no espírito dos homens. Ou seja, se afigura como o momento oportuno de o diabo se apoderar do corpo e da alma das pessoas já marcadas por sua falta de fé, pela pobreza de sua espiritualidade religiosa e pelo apego aos bens materiais.

Para esses religiosos, o fechamento das Igrejas seria então uma ordem oportunista do demônio com vistas a distanciar as pessoas umas das outras e, sobretudo, de Deus.

Tese apocalítica

 Já na tese apocalítica ou do fim dos tempos assegura-se, com base em passagens ou fragmentos textuais da bíblia, que o novo coronavírus representa, no limite, um indício do fim dos tempos, um sinal da volta do messias e de que o mundo está próximo do fim.

Para aqueles que se guiam por esse pensamento, o recurso mais apropriado nesse momento é, como nos “velhos tempos”, a oração, a reza, o clamor piedoso e o arrependimento profundo de todos os pecados praticados pelas pessoas e pela humanidade de um modo geral até este momento.

 A hora, mais do que nunca, é de suplicar, de se ajoelhar aos pés do criador (Deus) para pedir-lhes proteção, clamar perdão por tudo e por todos(as); a hora é de interpelar Maria, mãe de Jesus, para que interceda junto ao filho contra a morte de pessoas, especialmente as inocentes.

O que representam

Esses pensamentos (“teses”) não se excluem, se complementam; são parceiras no entendimento religioso; são produzidos no mesmo campo da religiosidade cristã e constituem um imaginário social recorrente, persistente ao longo das épocas. Por outro lado, a questão não é saber se são verdadeiros ou não, mas o que representam de fato.

 No meu entendimento, de alguma forma eles representam uma tentativa de levar pessoas a frearem “seus excessos”, a lembrar-se de valores, dogmas e ensinamentos religiosos abandonados, esquecidos e, portanto, ausentes ou enfraquecidos no ambiente social vivido comunitariamente.

Desentendimento

No âmbito da cultura social hegemônica, essas “teses” são as mais visíveis, as que mais ocupam o debate nos espaços da cultura política, popular e religiosa. No âmbito do debate político mundial, percebe-se que os países do chamado primeiro mundo, no Ocidente e no Oriente, têm sido mais racionais e competentes no esforço de prevenção ao poder dessa força invisível considerada “muito poderosa e perigosa” à existência humana. Já o Brasil, até agora, nem tanto.

O que se ver por aqui é a quase absoluta falta de um mínimo de consenso entre as autoridades, empresários e cidadãos. O desentendimento, a insensatez e a insanidade imperam entre nós até o presente momento. Ora, por quê?

Outras epidemias e pandemias

Talvez porque entre nós - os cidadãos e as autoridades políticas - seja pequena demais a capacidade de verdadeiramente prestar atenção à outras possibilidades da existência geral. Neste caso, forças poderosas e invisíveis existentes nas profundezas do universo natural. Na antiguidade remota, inúmeras civilizações desapareceram e até hoje não se sabe exatamente como e porquê.

No passado, outras epidemias e pandemias ocorreram. A mais famosa e lembrada ocorreu na Eurásia. Em meados do século XIV, essa parte do mundo sofreu com a Peste Negra (ou Morte Negra) que vitimou, somente no continente europeu, cerca de um terço de sua população. Ao que tudo indica, os eurasianos parecem ter acumulado capital cultural elevado a ponto de hoje ter medo do invisível; de olhar, ainda que inconscientemente, para outras formas e possibilidades da existência geral.

Reação dos nativos

Entre os nativos ou indígenas de vários lugares do mundo, inclusive do Brasil e do Tocantins, esse medo parece transcender qualquer coisa, afigurando-se não como alienação, mas como sabedoria, como “aura”, como prudência enraizada na própria experiência humana herdada do viver comunitário de outrora.

 Na verdade, com relação à ação das forças ocultas da natureza, hoje os nativos se comportam ainda mais conscientes e temerosos que os eurasianos (pelo menos no meu entendimento). Não por acaso que índios, sobretudo os menos ocidentalizados, começaram a sair por conta própria das cidades em direção às suas aldeias, e isso não apenas por determinação da polícia ou orientação das autoridades da tutela indígena, mas por conta de algo mais profundo: de uma prudência transcendental que habita as profundezas de sua alma e integra sua identidade cultural.

 Então, pode-se repetir: não por acaso, pois mais do que a gente, eles não apenas estão mais próximos da natureza como parecem conhecer, se relacionar e se comunicar com essas forças invisíveis, com esses “espíritos” de uma forma bem diferente de nós, uma forma transcendentalmente respeitosa, não arrogante, bem mais inteligente e zelosa, entendo eu.

Talvez seja isso o que realmente explique sua obediência transcendental de outrora, sua ação equilibrada e harmoniosa perante a natureza; talvez seja isso o que falte aos homens, sobretudo aos homens de negócios dos tempos idos e dos atuais, adeptos do progresso desenfreado, acostumados a colocarem seus interesses, seus bens materiais, sua ciência e sua tecnologia predadoras acima de tudo e de todos(as). Talvez seja o retorno dessa obediência transcendental, dessa ação equilibrada, desse medo prudente, dessa prudência ética com relação à outras formas invisíveis da existência geral o que se esteja exigindo através do novo coronavírus. Enfim, talvez se esteja exigindo menos arrogância, mais respeito, mais prudência, menos ignorância e mais zelo dos homens no trato com a natureza e suas forças invisíveis.

Desafio do novo coronavírus

Nesse ponto, é importante indagar se não agimos na natureza como se estivéssemos em guerra permanente contra ela, em uma guerra predadora e sem sentido contra a diversidade de outras formas de vida ou contra a multiplicidade de outras formas da existência geral, pois, no extremo, isso poderá implicar - senão no aniquilamento da vida em geral - no fim da espécie humana neste planeta. Aliás, não deixa de ser revelador que as palavras chaves enunciadas nos noticiários televisivos sejam “luta” e “guerra” contra o novo coronavírus.

A despeito do que se pode indagar neste momento, o certo é que, de fato, o novo coronavírus está aí, desafiando os laboratórios científicos, invadindo as veias humanas, ocupando a mente dos cidadãos e viralizando o debate público no cenário internacional. Pelo que tenho acompanhado até agora desse debate público, nos diversos espaços da produção cultural (tradicionais e virtuais), não restam dúvidas de que o novo coronavírus se apresenta com um problema monumental, não por si mesmo, mas por falta do cultivo de valores transcendentais por parte da humanidade.

Assim, a covid-19 não deixa de ser questão grandiosa que desafia os sistemas estabelecidos e a tão propalada racionalidade humana. Racionalidade esta personificada no progresso desenfreado, causador de tragédias de toda ordem, especialmente as ecológicas, sociais e ambientais. Como micro ser invisível o novo coronavírus obriga os homens a se colocarem de forma diferente, a refletirem diante do espelho sobre a questão referente à identidade de seu ser.

Problema mira todos

No Brasil, lamentavelmente o que temos visto e ouvido são alguns empresários e algumas poucas “personalidades” do submundo da política banalmente declararem ou insinuarem, conforme noticiado pela imprensa, que a economia não pode parar por conta de 5 ou 7 mil pessoas que irão morrer, como se vidas humanas tivessem algum preço e não significasse absolutamente nada para a sociedade. Olhando para esse universo mental, é lícito enxergar aí não apenas cegueira, insensibilidade e insanidade social exacerbada, mas um caldo cultural imprudente, inacreditavelmente incapaz de perceber que o alvo não são apenas os pobres ou as pessoas que vivem do salário para sobreviver. O problema mira indistintamente em todos(as). 

Dinheiro não imuniza

Aqui entre nós, os cidadãos ligados ao mundo empresarial e às forças hegemônicas do espectro político vigente se comportam como inatingíveis, como se não tivessem medo de nada. Porém, na verdade eles têm medo, embora se trate de um medo irresponsável, insano, imprudente, dominado pelo mito da inatingibilidade; trata-se de um temor superficial enfraquecido na própria experiência de vida que tanto e tantos cultuam.  

Pelo que se ver, o mais grave disso tudo é, em primeiro lugar, a cegueira, a sandice e o egoísmo dessas pessoas, as quais sequer conseguem enxergar que, desses milhares de mortos, um, pelo menos um pode ser ela própria, algum parente próximo ou uma pessoa muito amiga e querida de seu círculo de amizades; e, em segundo lugar, o empobrecimento de uma experiência de vida, a qual se torna cada vez menor, supérflua e erguida com base no fetichismo do dinheiro. Assim, nunca é demais lembrar o que já se disse tantas vezes até agora: “dinheiro não imuniza ninguém”.

Independentemente de se ter certeza ou não sobre o que é o novo coronavírus e de onde veio, importa observar que ele é um micro ser invisível. Um ser que em pouco tempo se firmou como detonador de múltiplas possibilidades enfraquecidas. No mais, quanto à esta questão colocada no título deste texto, ainda assim me vejo como o agnóstico diante da complexa e difícil questão relativa à existência ou não-existência de Deus: sem conhecimento suficiente para responder o que o novo coronavírus é e de onde realmente vem.

Autor

Profº Eugênio         

     *O autor é Bacharel em História e professor de História da Universidade Federal do Tocantins, campus de Araguaína