Marcos Reis

A notícia da renúncia do Governador Siqueira Campos, precedida pela renúncia também do vice João Oliveira, inicialmente causou pouco impacto no circuito político do Estado, ao contrário de quem, de fora, eventualmente possa ter sido surpreendido por tal medida.

Inicialmente tudo faz parte de uma estratégia ensaiada para a manutenção e perpetuação de um único grupo político nos mandos e controle do Estado, bem como de seus órgãos estratégicos, com o fim precípuo da perpetuação da atual oligarquia reinante. E não seria injusto dizer que o “siqueirismo” encontra-se presente antes mesmo da emancipação do Estado, com o fracionamento do norte goiano, uma vez que o próprio se autoproclama fundador do Tocantins. .

Um fato inconteste não pode ser ignorado: ao contrário do que imaginam ou deduzem os estrategistas políticos do atual governo, a opinião pública discorda, em sua ampla maioria, de uma eventual continuidade da família Siqueira Campos nos mandos do Estado.

Outro personagem emblemático e também diretamente influenciador nos primórdios do Tocantins, já não desfruta da mesma credibilidade e aceitação popular de outrora. Em quase seis décadas dedicadas à política e, a maioria delas ao Poder Legislativo, José Sarney, que deixou o Maranhão e plantou os pés no Amapá, sagrando-se por vezes consecutivas, senador com uma quantidade inexpressiva de votos, também amarga uma rejeição histórica, assim como sua família em todo naquele Estado. Os desmandos dos “Sarneys” apontam a um futuro melancólico desta que pode ser considerada uma das oligarquias mais poderosas da atual República.

No Pará, os Barbalhos ensaiam um retorno triunfal ao Palácio dos Despachos. Após uma vitória questionável de Jader no STF, no que diz respeito à aplicação da lei da Ficha Limpa, o senador paraense segurou a bitola absoluta do PMDB. Sua palavra no partido é lei. Desde 2002, vem testando por várias vezes, a elegibilidade do filho caçula, Helder Barbalho, tendo como balões de ensaio quatro eleições, sempre com expressiva votação. Helder foi o vereador mais votado de toda a história de Ananindeua, bem como foi o Deputado Estadual mais votado de seu tempo, eleito e reeleito em primeiro turno prefeito de Ananindeua, segunda maior cidade e colégio eleitoral do Estado, quando disputou com o atual prefeito desta cidade, o economista Manoel Pioneiro. Dois anos ausentes do cenário político foram suficientes para especular se o herdeiro político de Jader Barbalho já estaria apto para dar continuidade ao “jaderismo” iniciado pelo pai em 1983.

A bem da verdade, como manda o figurino, os antigos “chefes” estão envelhecendo. É natural que tentem, ainda que precária e sofregamente, participar dos domínios onde outrora eram soberanos, mas a pouca energia e vitalidade, já lhes impedem de maiores feitos. O “siqueirismo”, o “sarneyzismo” e o “jaderismo” são exemplos mais próximos e notáveis destas oligarquias supra fronteiriças do norte brasileiro, onde a maioria da população votante é pobre e desfavorecida até mesmo intelectualmente. Para isso, arquitetam cautelosamente a sucessão, sempre priorizando critérios “familiocráticos”, nunca perdendo o foco do exercício do domínio. Por outro lado, excluem critérios técnicos, à revelia do bem estar do povo, para instalar “goela abaixo” seus projetos de poder.

Um feito histórico temos percebido: a população, paulatinamente, tem dado respostas cada vez mais negativas às insistentes tentativas de perpetuação familiar no poder. No Amapá as pesquisas apontam que para o Senado Federal, José Sarney dispõe de esquálidos 6,5% da preferência popular, a despeito de sua história política. À reboque nesta decadência, Roseana Sarney não consegue equilibrar o Maranhão e o Palácio dos Leões se tornou cada vez mais alvo de investigações do Ministério Público Federal e do Ministério da Justiça. A segurança pública tem sido uma pauta amarga para a Governadora que se vê afundar também com o pai, e cujas forças da Rede Mirante de TV e Rádio podem já não ser suficientes para içá-la politicamente.

No Pará, Helder Barbalho se vale da conturbada e desequilibrada administração tucana e do poderio midiático que dispõe em seu patrimônio particular, a saber, a RBA, repetidora da Band no Estado e um número elevado de estações de rádio e TV, além de jornais diários, tendo como carro chefe o “Diário do Pará”, além de outros regionalizados, nos moldes de Folha de São Paulo e Estadão, mas ainda assim, carrega nas costas a maldita herança dos atos de improbidade do pai.

Para o Pará e o Maranhão, o resultado poderá ser previsível, se o povo permitir-se levar pelo colorido da campanha e pela “fanfarra” eleitoral.

O Tocantins é um caso a parte. A história do Estado confunde-se em muito com a trajetória política de Siqueira Campos. Atrevo-me a dizer que aqui quem pretendeu ou pretende fazer política, há de cruzar, de um modo ou de outro, com o “velho do Cariri”. Há atualmente apenas os “Pró Siqueira” e a oposição. Vislumbramos outras vias alternativas, mas nem de longe ameaçam essa dualidade histórica. E não ameaçam porque o povo já foi domesticado àquele velho hábito do “SIQUEIRA: AME-O ou DETESTE-O”.

A política tocantinense entrou em uma linha de conversão nefasta, cegando dolosamente as vias alternativas, única e exclusivamente porque quase sempre elas não dispõem da principal arma que os oligarcas manejam com maestria: o poder econômico. Será que o povo tocantinense irá responder positivamente à tentativa de manutenção da oligarquia siqueirista no Estado ou irá escolher uma oposição que tem também como foco o combate ao atual ex-governador e o legado que (bem ou mal) deixou?

Outubro nos dirá se irão governar por mais algumas décadas as velhas oligarquias regionais. Mas é sempre bom lembrar: quem decide isso, por incrível que pareça, somos nós mesmos.

Perfil

*Marcos Reis é advogado criminalista, escritor e professor de Direito Penal e Constitucional. É natural de Belém e reside em Araguaína onde exerce a advocacia e ministra aulas jurídicas. Pertence à Academia Paraense de Letras.