Uma empresa paulista de tecnologia, especializada na intermediação de criptoativos, foi condenada a ressarcir um investidor que teve suas moedas digitais desaparecidas após realizar uma transferência orientada pela própria plataforma. A decisão é da juíza Ana Paula Araujo Aires Toribio, da 2ª Escrivania Cível de Peixe, e foi publicada em 9 de dezembro de 2025.
A sentença determina que a empresa pague R$ 62.600,90 por danos materiais, referente ao valor das criptomoedas perdidas, e R$ 10.000,00 por danos morais, ao investidor, que é morador de uma cidade do sul do Tocantins.
O que aconteceu com o investidor?
Conforme relatado no processo, o investidor adquiriu unidades de uma moeda digital específica chamada POA, utilizando a plataforma da empresa. Quando a empresa informou que deixaria de negociar esse ativo, orientou o cliente a transferir os valores para uma "carteira digital" um aplicativo para armazenar criptomoedas.
Seguindo as orientações da empresa, o investidor realizou a transferência, e os valores chegaram à carteira de destino. No entanto, quando o montante transferido já havia gerado um lucro superior a R$ 60 mil, os ativos desapareceram. O consumidor ficou com apenas o extrato indicando que a transferência foi feita para um endereço desconhecido, o que impossibilitou a venda das moedas ou o acesso ao lucro.
Tentativas frustradas de resolução
O investidor tentou resolver o problema diretamente com a empresa e o suporte da carteira digital, mas não obteve respostas satisfatórias. A empresa se limitou a lamentar a perda das criptomoedas, sem oferecer uma explicação técnica. O investidor então registrou um boletim de ocorrência e procurou o serviço de proteção ao consumidor antes de acionar o Judiciário em 2022.
Defesa da empresa
A empresa, durante o processo, alegou que sua responsabilidade se restringia à conversão de moedas e que a custódia das carteiras digitais externas era de responsabilidade exclusiva do usuário. Também argumentou que a segurança das senhas e acessos era responsabilidade do consumidor e que não houve falha em seus sistemas, sugerindo que o erro poderia ter sido causado por fraude externa ou por negligência do próprio investidor.
Análise da juíza e decisão
Ao analisar o caso, a juíza aplicou o Código de Defesa do Consumidor (CDC), entendendo que a empresa fazia parte da cadeia de fornecimento do serviço e tinha responsabilidade objetiva. Ou seja, deveria responder por falhas, independentemente de culpa. A magistrada destacou que a relação entre a empresa e seus usuários é de consumo, o que torna a empresa responsável pela falha na prestação do serviço.
A juíza também decidiu inverter o ônus da prova, obrigando a empresa a comprovar que o erro foi do cliente, devido ao seu conhecimento técnico. Como a empresa não apresentou dados técnicos que comprovassem o destino das moedas ou a negligência do consumidor, a juíza reconheceu a falha no serviço prestado.
"Mesmo que a empresa alegue que o problema tenha ocorrido na carteira externa, isso não a exime de responsabilidade, pois o consumidor não é obrigado a identificar e demandar individualmente cada parte da cadeia de fornecimento", afirmou a juíza na sentença.
Indenização por danos materiais e morais
A juíza determinou que a empresa devolvesse o valor integral das criptomoedas perdidas, no montante de R$ 62.650,90. Além disso, a empresa foi condenada ao pagamento de R$ 10.000,00 por danos morais, considerando o desgaste emocional sofrido pelo investidor diante do desaparecimento dos criptoativos e das tentativas frustradas de resolução do problema.
A decisão também aplicou a teoria do desvio produtivo, conceito jurídico que reconhece o tempo do consumidor como recurso valioso. A juíza entendeu que o tempo do investidor foi "desperdiçado" em tentativas de resolução do problema, como e-mails e idas ao Procon e à delegacia, sem sucesso.
"O valor de R$ 10 mil é adequado às circunstâncias do caso e compatível com a extensão do dano", concluiu a magistrada.
Próximos passos
Ainda cabe recurso da decisão ao Tribunal de Justiça do Tocantins.

