
Uma nova pesquisa, publicada na revista científica Revista Foco, revela um paradoxo: embora o Brasil possua uma legislação robusta para a proteção dos direitos da pessoa autista, a ausência de políticas públicas voltadas para a vida adulta perpetua uma "invisibilidade institucionalizada".
Um novo estudo dos pesquisadores André Luiz Alvarenga de Souza e Sabrina Inacio Massuda expõe uma contradição no tratamento do autismo no Brasil. A análise, publicada na Revista Foco, demonstra que, enquanto as leis avançaram no reconhecimento formal dos direitos, a aplicação prática e as políticas públicas continuam focadas quase exclusivamente na infância, deixando a população autista adulta desassistida e marginalizada.
A pesquisa aponta para o que chama de "infantilização normativa". Leis como a Lei Berenice Piana (nº 12.764/2012) foram marcos importantes, mas o seu foco em diagnóstico precoce e inclusão na educação básica fez com que o sistema negligenciasse as necessidades da vida adulta. O Censo de 2022 mostra que 54% da população autista do país já é adulta, mas os dados revelam uma exclusão progressiva: apenas 0,8% dos autistas com mais de 25 anos frequentam o ensino superior.
Este abandono institucional contrasta com o perfil cognitivo desta população. O estudo refuta o estigma de que o autismo está sempre ligado à deficiência intelectual, citando dados que mostram que cerca de 59% dos autistas têm QI médio ou superior.
Para reforçar que as barreiras são sociais e não intelectuais, a pesquisa menciona casos documentados de altas capacidades, como relatados pelo neurocientista Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, membro de sociedades de alto QI e de grupos para estudos com autistas como o RG-TEA.
Segundo os autores, esta invisibilidade se reflete em todas as áreas da vida adulta. No mercado de trabalho, persistem barreiras e práticas capacitistas, mesmo com a existência de leis de cotas. Na saúde, os dados são alarmantes: um levantamento citado no artigo mostra que 64,7% dos autistas adultos nunca receberam orientação sobre sexualidade e 78% com mais de 50 anos não possuem um plano terapêutico continuado.
A pesquisa conclui que a inclusão plena exige uma rutura com os paradigmas que infantilizam o autismo. É preciso que a neurodiversidade seja reconhecida como um pilar da cidadania ao longo de toda a vida, com a criação de políticas de empregabilidade, moradia, saúde mental e, principalmente, com a escuta ativa dos próprios autistas como especialistas das suas vivências na formulação de novas leis e ações.